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terça-feira, 25 de janeiro de 2011

O guri do milho


Tarde dessas saí para caminhar na beira da praia, pensar na vida, admirar aquele marzão e depois contemplar o belo pôr-do-sol. Andava lá pela casinha de salva vidas número doze, quando me dei conta da quantidade de pessoas na areia. Até então não havia percebido, pois estava bem concentrado na tarefa de pensar em mim. Mas não é que aquelas pessoas desconhecidas começaram a me chamar a atenção? Cada grupo de família, um do lado do outro, preenchia cada espaço na areia. Com seu guarda-sol colorido ou de uma cor só, jogando, comendo, conversando, rindo ou apenas quietos. Cada família com suas histórias, todos com o bem comum de curtir aquela tarde de praia. Queria saber o que eles tinham pra contar, se eu poderia tirar dali alguma história interessante. Mas não é que deu uma vontade de comer um milho? O sol tava alto e as minhas costas ardiam. Lembrei que me esqueci de passar o protetor. Metade do caminho já andado eu não voltaria. O milho tava mais perto. Seguindo meu caminho, percebi que já tinha seguido o bastante pra poder sentar e começar a minha meditação. E foi isso que fiz. Com meus chinelos já gastos pelo uso, agachei e sentei de frente pro mar. Não hesitei em estar no meio do caminho e com minha solidão, cruzei as pernas e comecei a pensar. Pensei, pensei e só sabia pensar no bendito milho. A vontade de comer tava dando lugar à fome mesmo. Olhei pros dois lados e cadê o guri do milho? Nada dele aparecer. Olhava pra um lado, pra outro e nenhum sinal do carrinho. Voltei então pro meu estado de contemplar o marzão, quando ouço um grito de longe: - Olha o milho aeeee! Na hora eu me virei, levantei e procurei pelo grito. Ali perto do guarda-sol laranja vinha um carrinho de milho. Parei e no mesmo instante, o piá de uns 14 anos me solta:

-
Hoje tá brabo de pegar uma “mina”! Desde cedo não consegui nada.

Eu ri e aproveitei a situação de intimidade que o guri me proporcionou. Todo atrapalhado em me atender e contar a sua história, ele me contou que tava difícil aquele dia de vendas e que antes de chegar a praia ele e um amigo se meteram numa confusão no ônibus e ele tinha que se cuidar pra não ser pego. Pediu pra eu escolher o milho e eu disse que podia ser qualquer um. Já no fim da tarde, aquele milho já não estava quentinho. Pedi uma água sem gás. Ele continuava contando da dificuldade de ‘pegar uma mina’ e eu dava motivação pra ele:

-
Logo mais em frente tu consegues uma, tem bastante praia ainda.

E ele:

-
É verdade, quase consegui antes, tava quase lá, mas a vó dela tava por perto, aí não deu.

E eu:

- Poxa cara, mas não desiste, vai em frente!

Então eu lhe dou o dinheiro e o guri atrapalhado e nervoso pra encontrar uma ‘mina’ e com um receio de ser pego pelo cara do ônibus, me dá o troco. Espero ele se dar conta que deu errado, e não se dando conta eu digo:

-Te dei uma nota de dez.

- Ah é verdade, desculpa aí!


E o guri se vai, empurrando seu carrinho, mais preocupado em pegar alguma “mina”, do que vender. Naquele dia o ganho dele era a “mina”. E eu me sentei de novo ao meu lugar e comi meu milho, admirando o mar e pensando no futuro que espera o guri, se ele estuda, se tem pais, o porquê está vendendo milho. Queria saber mais sobre aquele piá, mas eu me contive. Quem sabe um dia eu encontre ele de novo e pergunte. Preferi comer meu milho mesmo. Deu sede. Ao abrir a garrafa de água, ouvi o barulhinho. Era água com gás. Dei risada e depois da fome saciada, segui com minha espera pela praia vazia, pelo vento da noite, o silêncio do mar e o pôr-do-sol. Meu ganho aquele dia era o pôr-do-sol, a “mina” eu deixo pro guri do milho!

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

O bem que faz o “camareeeuu”


Época de veraneio pra mim, sempre teve aquela cara de dias longos, sem nada pra fazer, só de pernas pro ar. A brisa do mar, o sol torrando a pele e ardendo depois. Medo da mãe d’água e do siri. Protetor espalhado por aí, sacolinha de lixo lá, frescobol, guarda-sol e churrasquinho. Abre cadeira, fecha cadeira. Procurar lugar pra estacionar, visitar os molhes, andar de vagoneta, escutar o tio gritando: - olha o camareeeuu... (pra quem conhece o Cassino sabe do que falo!). Areia no carro, em casa, na cama, em tudo. Comilança, comprança e aquela gostosa preguiça. Milho, cerveja, caipirinha e mais areia atrás da gente. Há tempos atrás eu achava tudo isso um saco, vivia de cara amarrada por ter que veranear por quinze dias, uma semana tava ótimo. Oh coisa boa que eu mudei de ideia! Agora achei algo pra fazer: me conhecer e aprender a conviver comigo. Muita coisa nova tá surgindo, descobri ser fã de crônica, do David Coimbra e da rádio Atlântida, de novela, filme brasuca e palavras cruzadas. Nunca pensei que passaria horas vidrado, querendo desvendar as palavrinhas nos quadradinhos. Até de acordar cedo eu tô gostando e voltando a ler também, oh saudade desse hábito! Estou conseguindo me renovar e é maravilhoso saber que a gente consegue fazer isso, basta querer. Outra coisa que eu me surpreendi e constatei é que o tempo tá passando rápido e eu tô ficando velho. Nestes meus vinte um anos de vida marota eu começo a dar valor pra certas coisas deixadas de lado. Entendo que a culpa é da minha saída de casa pra estudar fora e começar a tentar viver minha vida. Sinto falta da minha família e vejo o quanto eles são importantes pra mim. Pode ser tarde demais pra isso, mas pelo menos tô me dando conta. Brigas, puxação de pé e hora certa pra chegar em casa, eu tava sentindo falta disso. Muita gente não tem a honra e a oportunidade de passar por essa fase. Eu me orgulho em dizer que meus pais tão juntos comigo. A gente cresce e amadurece e sabe quando isso acontece. Cada dia é uma chance pra poder fazer diferente e rever o que importa pra seguir adiante. Não tenho mais aquela inocência de criança e entendo que meus dias tão diminuindo e dos meus pais então... Novos olhares, novas perspectivas, velhas vontades, velhas manias, tudo se completa, tudo faz parte da gente. O mais gostoso é saber que podemos mudar e ainda assim continuar a mesma pessoa. Enfrentar fila de mercado, banco e padaria, engarrafamento e mosquitada. Andar de bicicleta, comer sorvete e brincar com a irmã. Ficar embaixo da árvore, catar uma fruta, olhar o céu, as nuvens, o sol e as estrelas. Pra mim, tudo isso e mais um pouco é o que tem se tornado as férias de verão, férias de verdade, onde a gente não consegue ficar sem fazer nada e reconhece que faz um bem enoooooorme, do tamanho do grito do tio do: - olha o camareeeuu... pode acreditar!